Iniciei minhas atividades no Ministério Público na cidade Ponta Porã, interior do Mato Grosso do Sul, fronteira com o Paraguai. O momento era de grande importância "tanto no pessoal como no profissional" como diria o Faustão, haja vista não só a expectativa de começar a trabalhar após a aprovação no concurso público, como também o fato de ir morar sozinho em outra cidade, longe da minha família e amigos.
E dentre outras questões que surgiram ao sair da comodidade da casa dos pais era: o que comer? Cozinhar sem chance, não dava para viver de ovo frito e macarrão instantâneo toda hora. Então começei a acompanhar os meus colegas de trabalho em um restaurante self service que cobrava por quilo. Era legal almoçar e conversar com o pessoal do trabalho, mas havia dois problemas - eu comia um prato razoável e gastava pelo menos uns 15 reais com a bebida (os meus colegas gastavam 7 reais mas comiam como periquitos, sinceramente não sei como se aguentavam em pé no trabalho depois) e, ao final da tarde, mesmo após algum lanche feito na copa do trabalho, já estava com fome de novo.
Procurando outra alternativa, me indicaram uma senhora que fazia marmitex em sua própria casa. Encontrei o que seria a minha refeição quase que diária durante o pouco mais de um ano em que estive na fronteira. O marmitex, além de lembrar o gosto de comida caseira que os restaurantes não tinham, custava apenas 5 reais e dava para almoço e janta! Mas não demorou muito e apareceram as gozações: " 5 reais! não deve ser bom, como você é pão duro!" Ou então diziam: "Nossa você ainda almoça e janta a mesma comida requentada, que absurdo"! Qual o problema se eu gostava da comida e era barata?
Certa vez li numa revista um artigo afirmando como as pessoas atribuem valor às coisas simplesmente pelo preço. Como teste, colocaram um violinista famoso tocando na rua, e ninguém dava bola. O detalhe é que as apresentações desse violinista eram sempre lotadas e o valor do ingresso era de nao sei quantos mil reais. O mesmo aconteceu pelo fato de eu morar em um hotel simples, mas que tinha tudo! Quase todos falavam: "Que loucura! Morar em um quarto! Por que não monta um apartamento? É pão duro mesmo!"
Mas gostei muito de morar no hotel e tenho ótimas lembranças de lá. No quarto tinha cama de casal, ar condicionado, TV e banheiro com chuveiro elétrico. Comia um baita café da manhã todo dia e não precisava me preocupar com limpeza e arrumação do meu quarto, como em qualquer hotel.
Quando me encontram hoje em Campo Grande e eu conto que estava em Ponta Porã é recorrente ouvir: - Que bom! Que sorte você ter voltado para Campo Grande!" E eu sempre respondo: - Olha, se foi sorte ou não, só sei que voltei. Se eu estivesse lá ainda, também poderia me considerar com sorte. É um ótimo lugar de se morar. Fui muito feliz lá, assim como sou muito feliz aqui!