Eu respeito os índios. Assim como respeito os brancos. Assim como respeito os negros. Assim como respeito e procuro respeitar todos. Afinal, somos todos seres humanos não é mesmo? Mas o que me chama atenção na complexa e difícil situação indígena no país, e especialmente no nosso estado, é que não parece haver um projeto de longo prazo, sério e claro que devolva de fato a dignidade e autonomia que os índios perderam com a dominação dos brancos. O foco central das controvérsias é a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas. Ou seja, seus ancestrais teriam sido expulsos de terras hoje ocupadas por ricos fazendeiros. Estas devem ser devolvidas aos descendentes, seus legítimos proprietários. Nada mais justo, não?
Obviamente, o assunto exige um melhor aprofundamento. Mas a grosso modo, vamos lá, demarcam-se as terras como prevê a Constituição e fim de conversa. O que quero entender é: O que vem depois disso? O que se pretende? Os índios serão transformados em agricultores? A situação atual de famílias vivendo de cestas básicas doadas pela FUNAI, sem recursos, sem água potável, sem perspectivas, irá mudar pela pura e simples aquisição de mais terras? Tudo bem, os índios sairão das beiras de estradas, onde muitos já morreram atropelados, e terão um espaço maior para viver. Mas e aí? Há um programa para especializar os índios em agricultura de maneira que eles subsistam dessa atividade econômica?
Ah, isso é papo de branco, muitos dirão! O índio não é assim, ele tem uma relação diferente com a terra. Ele vive em harmonia com a natureza. Não é uma relação econômica. A natureza provê tudo o que ele precisa para viver. Natureza? Que natureza? Infelizmente, não há mais natureza nestas terras pleiteadas pelos indígenas. Não há mais floresta nativa, não é mais possível caçar o alimento com arco e flecha. Hoje o que há nessas terras é somente uma grande área destinada a alguma atividade agropecuária. A natureza, a floresta, os animais, as árvores, tudo se foi. E o pouco que há é preciso preservar, sem dúvida.
O que quero dizer é que não é mais possível voltar ao "status quo" do indígena primitivo. Não se trata de civilizar o índio. A transformação de seus hábitos já se operou. Muitos deles já falam português, usam computadores, vestem calças jeans, camisetas e tênis da nike. Como todos nós. Os índios querem energia elétrica, moradias, escolas, saúde e segurança. Como todos nós. Percebam, o problema não é só indígena. O problema é muito maior. A questão é de dignidade da pessoa humana. Do índio, do branco, de todo mundo.
Claro que o aspecto cultural do indígena deve ser levado em conta. Como de qualquer outro povo. Não discuto isso. E todo povo tem seu valor. Não é porque uma sociedade é mais desenvolvida tecnologicamente que ela é superior. Aliás, em muitos casos se dá o contrário. Mas o fato é que, bem ou mal, as coisas mudaram. Os negros, de maneira semelhante aos índios, também viviam em tribos e ocas quando os tiramos de seu "habitat" para escravizá-los. A tecnologia e o capitalismo estão aí, queira ou não queira.
Antigamente o índio vivia da terra e da natureza. Hoje, infelizmente, ele precisa de dinheiro para sobreviver. Então pergunto novamente: Qual a colocação do índio nesse contexto? Apenas “ser índio”? O simples fato de ser índio provê o sustento dele e de sua família? Superado o problema das terras demarcadas serão eles transformados em agricultores e poderão subsistir e ter autonomia com essa atividade? Ou continuarão dependendo de cestas básicas e morrendo à míngua em assentamentos sem nenhuma infraestrutura? Será que há mesmo um projeto sério para a verdadeira libertação do povo indígena?
Ou será que a coisa é mais ou menos como vemos nas políticas e programas sociais para “homem branco”? Não se estabelecem metas de longo prazo para geração de renda, não se investe em educação e qualificação, as populações carentes permanecem dependentes e o assistencialismo perdura por prazo indeterminado. Resumindo, a boa e velha massa de manobra. Estou enganado?
Se as terras indígenas do MS fossem demarcadas como reza a Constituição de 88, que deu prazo para que isso fosse feito até 1993, uma das primeiras consequências seria a recuperação das matas ciliares, destruídas pelos fazendeiros que plantam soja e pasto até a beira dos rios, desrespeitando a legislação. Isso faria que evaporasse menos água e aumentaria a quantidade de peixes, sem ao assoreamento. Por que não pagar aos índios por esse serviço ambiental, já que a água que usamos na cidade, um bem cada vez mais escasso, tem sair de algum lugar? Também recuperaria a fauna, dizimada pela falta de habitat e pelos agrotóxicos. Os índios poderiam voltar a construir suas casas com teto de capim, que uma tecnologia superior as telhas de amianto das casas dos programas de habitação, pois mantém o interior fresco e deixa passar a fumaça, já que muitos índios fazem fogo de chão para cozinhar e se aquecer a noite. E não é verdade que todos índios querem ter eletricidade, muitos querem, mas o que não querem tem que ser respeitados. É melhor pra todos, menos barragem para fazer hidrelétricas.
ResponderExcluirE os índios não são carentes, são apenas vítimas do esbulho de seu território tradicional pela elite gananciosa e corrupta do MS.
Muito interessante. De fato eu não sabia dessas ótimas iniciativas que combinam o modo de vida dos indígenas com a preservação da natureza. Isso de certa forma procura resgatar um pouco a relação de equilíbrio que eles mantinham com o meio ambiente, bem diferente de nós "brancos" que depredamos tudo, como se não existisse outros vários meios de produzir sem devastar com todos os recursos naturais.
ResponderExcluirMas a pergunta ainda permanece: como os índios subsitirão? É preciso mais que alguns peixes, que só virão a longo prazo, e pequenas plantações para sustentar centenas de famílias.
E já aproveito o seu comentário para lançar outra pergunta: existe um investimento ou programa estatal sério, além das cotas do PROUNI, para os índios que desejam participar da sociedade, estudar, ter emprego, casa, energia elétrica como vc disse e etc?
Ou será que é mais interessante o estado ir confinando os índios em suas terras, os que queiram e os que não queiram(ou em beiras de estradas, triste realidade) por que há medo de que muitos deles venham para as cidades e se crie mais problemas com preconceito, além de falta de estrutura, saneamento, saúde, moradias, etc. Afinal nem nós que estamos nas cidades temos isso disponível para toda a população "branca".
E a fonte do problema acaba mais uma vez no descaso e na corrupção, como vc disse. Mas excelente seu comentário, de quem realmente entende do assunto. Obrigado.